Cansaço psicológico

 

Descrição da imagem: homem de olhos fechados apoiando o rosto numa das mãos.

A grande maioria das pessoas pode pensar no cansaço como um estado físico. O suor, a sensação corporal de uma dor leve nos músculos, um desejo quase que incontrolável de deitar-se ou apenas ficar quieto num canto. Porém, aqui no Brasil precisamos entender que nossa cultura, que é em grande parte conservadora, tende a louvar esse tipo de estado corpóreo.

Isto porque o trabalho físico pode ter mais valor moral pro povo do que o trabalho intelectual.

Parece existir uma hierarquia moral entre o trabalho intelectual e o trabalho físico, sendo que o segundo aparenta ter mais valor. E não estamos falando aqui (obviamente) de recompensa financeira, mas sim de um reconhecimento simbólico que atravessa nossas relações sociais.

É claro que existe uma vantagem socioeconômica em exercer um trabalho intelectual. Não depender do esforço físico para sobreviver num país tão desigual quanto o nosso tem claramente que ser encarado como uma vantagem. Porém, pode acontecer do sujeito que sobe de classe econômica não conseguir reconhecer seu esforço quando o mesmo não é físico.

E não reconhecer o próprio sofrimento, grande parte das vezes, é uma receita pronta para o adoecimento psicológico.

Precisamos sim reconhecer os privilégios do trabalho intelectual, mas sem nos entregar ao stress seguindo comportamentos que são em grande parte autodestrutivos como ignorar sinais de ansiedade e depressão. O adoecimento da mente é um grande problema numa sociedade que tem dificuldade de reconhecer esse tipo de sofrimento como válido.

Não é raro ver na nossa cultura discursos negacionistas em relação ao sofrimento de ordem psicológica, sendo que em sua forma mais branda, esse tipo de preconceito em cuidado de saúde se faz dando a entender que sofrer por questões psicológicas seria uma fraqueza ou desvio de caráter.

É por isso que o trabalhador, principalmente aquele que vem de uma origem mais humilde não se permite reconhecer o cansaço psicológico.

Nos obrigamos a trabalhar mais porque é apenas mais um relatório, mais uma reunião. As vezes lembrando que nossos ascendentes trabalharam talvez por 30, 50 anos vivendo do suor e do sangue. Não aceitamos dizer que é demais, ou que não estamos dando conta, até porque muitas vezes a pobreza nos ensina que demonstrar fraqueza é abrir brecha para que a chance (as vezes rara) de ser bem-sucedidos possa escapar.

... E adoecemos.

Na ausência de um escape simbólico para o cansaço psicológico, o corpo começa a autenticar esse cansaço ou esse sofrimento de forma física. Então entra em jogo a somatização do sofrimento, seja através da ansiedade, das crises de pânico, até mesmo da piora de doenças já existentes, mesmo com eventos como a queda da imunidade ou outras situações. - Lembrando é claro que patologias psicossomáticas carecem de avaliação médica.

Agravante na psicologia preta.

Em indivíduos de ascendência africana, é importante destacar que o racismo estrutural tem em seu modus operandi nefasto a disseminação de mitos contra as pessoas negras como dizer que as pessoas escravizadas ou ex-escravizadas eram "preguiçosas". 

Esse estigma bizarro persiste até mesmo hoje fazendo muitas vezes que pessoas negras sejam tratadas de forma mais severa por seus superiores ou fazendo com que elas próprias exijam de si mesmas muito mais do que outras pessoas. Esse assunto é discutido também quando se fala, por exemplo de conceitos como black excelence.

Porém o fato é que o racismo estrutural pode agravar ainda mais o cansaço psicológico em pessoas negras por conta do que relatamos acima.  

Como evitar que o cansaço psicológico se torne um processo de adoecimento?

É importante destacar que qualquer sintoma físico deve ser avaliado por um médico e que a melhor forma de tratar transtornos como ansiedade, depressão e outros é através de intervenção psicológica e psiquiátrica quando necessário.

Porém sempre podemos prestar mais atenção no nosso corpo fazendo as seguintes perguntas:

  1. O que eu estou sentindo?
  2. Em que parte do corpo estou sentindo isso?
  3. Em que local isso costuma acontecer?
  4. Qual o tipo de situação acontece antes, durante e depois de eu sentir isso?

Ao fazer essas perguntas estaremos mapeando nosso comportamento e entendendo um pouco mais sobre o que nos cansa. Assim podemos perceber os nossos limites e adquirir aparato simbólico para que possamos lidar verbalmente com essas situações. Entender os processos que acontecem a nossa volta e influenciam nosso comportamento é uma forma de lidar com eles.

Mas como sempre, reforçamos que a intervenção mais segura é sempre procurar ajuda profissional!

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