O Mundo Sombrio de Sabrina e o desenvolvimento da personalidade adolescente


Recentemente o Netflix estreou um remake da aclamada série dos anos 90 que por aqui se chamava "Sabrina, Aprendiz de Feiticieira" que teve 7 temporadas sendo exibida até meados de 2003 nos EUA.

Imagem: foto da personagem da série clássica.

Invocando o arquétipo do aprendiz de feiticeiro, tanto a série clássica como a nova versão feita pelo site de streaming narram as aventuras de uma jovem bruxa (ou feiticeira na série clássica) que vive divida entre sua vida mortal, onde frequenta o High School, ou seja, o equivalente ao ensino médio brasileiro, e ao mesmo tempo aprende sobre feitiços e criaturas sobrenaturais.

MAS NÃO SE CONFUNDA, APESAR DE SER UM REMAKE TEMOS DIFERENÇAS SIGNIFICATIVAS NESSA NOVA SÉRIE.

A versão produzida pelo Netflix se baseia mais num arco publicado em forma de quadrinhos com um tom mais sombrio envolvendo a mesma personagem do que na série dos anos 90. E é interessante a gente notar uma grande diferença de tom no que se refere a profissão da protagonista, afinal de contas aqui no Brasil pelo menos, Sabrina era aprendiz de "feiticeira".

Imagem: Montagem misturando a história em quadrinhos na qual se baseia a série e a atriz que protagoniza o seriado.

Nos EUA a terminologia usada era "Witch", que corresponde a "bruxa". Mas no Brasil decidiram que Sabrina se parecia mais com uma feiticeira, o que de certa forma, se a  gente for lembrar a série original faz até sentido apesar de uma referência ou outra a um mundo mais sombrio.

MAS QUAL A DIFERENÇA?

A série clássica tinham um tom mais infantilizado, apesar de nos EUA eles continuarem chamado ela de "bruxa". Quem é familiarizado com as histórias de fantasia sabe que feiticeiro é um personagem que faz magia de uma forma mais "natural" mas não é necessariamente envolvido com magia "das trevas", no entanto os bruxos de certa forma são necessariamente maus mexendo com o "lado sombrio" da magia. Se isso não ficou claro a princípio, você vai logo perceber que as bruxas desse universo fazem parte da igreja da noite, que é a igreja do capiroto!

Foto: Sabrina e outro personagem na frente de uma estátua de Baphomet

Então fique avisado que este ramake já deixa claro que a série clássica vai ficar como uma lembrança no plano de fundo afinal de contas, a nova versão se chama O Mundo Sombrio de Sabrina e deixa claro que agora a personagem reside num mundo mais parecido com um filme do Cine Trash do que uma fantasia adolescente como é o caso de Harry Potter.

SOBRE ADOLESCÊNCIA

A série acaba fugindo dos já manjados clichês envolvendo as alegorias sobre a puberdade e quando fala sobre sexualidade ao invés de fazer rodeios deixa bem claro do que está falando, chegando a tratar inclusive sobre temas complexos como a descoberta da sexualidade de certos personagens e até mesmo uma afirmação bem segura da sexualidade de outros.

Mas o tema que mais me chamou atenção na história foi sobre um conflito bem comum que eu vejo o tempo todo na adolescência que é a identificação com grupos sociais, principalmente aqueles que são opostos aos grupos autenticados pela família do sujeito.

SER VOCÊ É NÃO SER O OUTRO

Tá, por mais que essa frase possa parecer ter saído de um meme, a adolescência é uma fase em que o sujeito está formando sua personalidade e sua individualidade. E ouso dizer que nossa personalidade é uma espécie de membrana que separa o que está dentro de nós do que está "fora". Traduzindo pra um português bem claro, pra dizer quem nós somos temos que ser capazes de dizer quem nós não somos.
Imagem: Meme (montagem) com o personagem Gandalf utilizado para demonstrar expressões óbvias.
 
Por isso muitas vezes a adolescência é uma fase em que o sujeito precisa negar sua semelhança com um grupo de origem, geralmente o grupo familiar que é uma espécie de associação automática que a sociedade faz seguindo o clássico clichê "filho de peixe peixinho é". Por isso em alguns casos o adolescente acaba negando identificação com os arquétipos sociais que a sua família carrega numa tentativa de dizer "hei, olha pra mim, eu sou um indivíduo, não apenas um membro da minha família".

E a gente vê isso claramente no comportamento de Sabrina ao negar a religião da sua família, fazendo vários questionamentos as práticas executadas por esse grupo e muita das vezes indo contra os dogmas estabelecidos por eles numa clara afirmação de individualidade.

Foto: Sabrina e três outras bruxas.

É claro que, seguindo o arquétipo do aprendiz de feiticeiro carregado por tantos personagens como Harry Potter, Percy Jackson, Tim (Livros da Magia) e muitos outros que nos remetem a histórias ancestrais, a rebeldia do personagem pode ser atribuída ao seu status de "Herói Escolhido" que muitas vezes acaba trazendo uma mudança do status quo desse mundo mágico.

No entanto, essa comparação com um comportamento tão frequente na adolescência não deixa de ser interessante, aliás, a adolescência é uma fase em que o sujeito mais se identifica com grupos sociais de características fortes, deixando exacerbar todos os traços necessários para que ele seja identificado como membro.

E PODEMOS VER SABRINA PASSAR POR ESSE PROCESSO DE ESCOLHA DE IDENTIFICAÇÃO DE GRUPO.

De uma forma bem caricata, podemos analisar em última instância que o dilema de Sabrina entre sua mortalidade e sua vida como bruxa pode ser encarada como uma caricatura do processo de busca por individualidade de um adolescente que também perpassa pela identificação com um ou vários grupos de características distintas sendo esta uma afirmação da sua própria personalidade.

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