Bacurau e a vingança cultural


A gente sempre tem batido um longo papo sobre a importância da representatividade na cultura, principalmente no que tange a questão da representatividade negra num país em que 60% da população tem essa característica étnica mas 70% dos ricos ainda são brancos. Mas representatividade vai muito além das questões étnicas nacionais que são um fardo pesado carregado pela nossa população, afinal de contas, o storytelling ajuda a formar as bases das nossas mentes e quem sabe até mesmo nossas projeções de nós e da nossa sociedade a volta.

É nesse contexto que o filme Bacurau nos apresenta uma vingança cultural.

Sem dar spoilers  a gente pode falar que, além de ser uma obra catártica que bebe muito do cinema de faroeste dos anos 70, que teve sua poeira levantada novamente com o novo filme do Tarantino, diretor que também parece influenciar esse longa, podemos dizer que Bacurau tenta brincar com arquétipos já consolidados e, por que não, polêmicos que muitos se negam a enxergar.

Se Tarantino brinca com o revisionismo histórico, Bacurau nos traz um revisionismo cultural.

O longa brinca com clichês da cultura Brasileira que devido ao nosso "complexo de vira-latas", e por que não diagnosticar como fundado nas nossas bases que podem ser explicadas pela psicologia sócio histórica,
A psicologia sócio histórica: é uma área da psicologia social que considera que o sujeito é formado nas relações com o outro e a sociedade em si descartando um entendimento generalista da formação da pisque e ainda aceitando a influência da cultura no mesmo.
Esses arquétipos da cultura nacional geralmente são subvalorizados em detrimento dos astros brancos de olhos azuis dos filmes de ação gringos, mas que em Bacurau se veem demonizados e ao mesmo tempo, riem da autovalorização que a elite branca do nosso país dá as suas origens "europeias", brincando até mesmo os traços caucasianos "puros" herdados desta fonte em certo momento chegando esses vilões que fora de contexto poderiam ser mocinhos de um filme B a dizer que que certos personagens seriam no máximo "mexicanos brancos".

E tendo a psicologia sócio histórica em foco, podemos dizer que o filme brinca com a estrutura colonial eurocêntrica que funda a sociedade brasileira. 

O Brasil foi fundando sob uma ótica de "interior do mundo" que sempre se refere a uma capital estrangeira como a fonte do saber, cultura e riqueza. Se nos tempos da colônia literal essa referencia era Portugal, no Brasil da psique colonial a referência pode ser a ideia de Europa ou essa fantasia que o EUA vende de si mesma através da cultura pop dando a entender que o que nasce no Brasil é de segunda ordem, de terceira categoria ou menos valioso do que aquilo que vem da "capital".

Brincando com arquétipos, valorizando a história brasileira e com uma montagem e cenas de ação que conseguem perder o espectador, Bacurau promove revisionismo cultural, colocando em xeque o que a gente acha que é bom, e questionando se o que vem de fora reflete nossa realidade, o que é uma ação muito importante no Brasil em que estamos vivendo.

Um filme que certamente retrata a nossa época com qualidade artística e, por que não, de entretenimento.

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