Corpo Geográfico

 Ontem falei sobre o corpo político e hoje me peguei pensando nesse corpo que também é geográfico. A gente tem discutido tanto sobre racismo ambiental ultimamente sem pensar que talvez o lugar onde nascemos, crescemos e vivemos nossa vida adulta também nos molda subjetivamente e politicamente.

Eu, por exemplo, cresci há algumas centenas de um rio que dá nome a minha cidade, um rio pequeno, mas que corre dançando em suas curvas por entre os montes, portanto, meu horizonte eram só morros. Acredito que ali a gente não conseguia ver mais do que dois quilômetros de distância. Mas como eu morava numa casa de segundo andar, eu conseguia olhar por cima dos morros. Eu via uma torre de comunicação que se erguia em outro bairro, via prédios distantes e isso meio que criou em mim um espírito de exploração.

Especulo aqui que outras crianças que não conseguiam olhar por cima do morro, por cima das árvores que cercavam a gente como muros de um feudo, não conseguiram imaginar além deles.

E quando falo de corpo geográfico não tô dizendo aqui apenas daquilo que a gente pode ver, mas também daquilo que a gente pode acessar. O tanto que a gente pode explorar. Sobre a cultura que nos cerca nesse ambiente de vizinhança.

Quando era criança o centro intelectual e porque não cultural daquele vale era uma comunidade católica. Hoje pequenas igrejas evangélicas, algumas delas não filiadas a nenhuma rede institucional, dominam o lugar. E, depois da escola, que sofre amargurada nesse território, seguem sendo o centro intelectual, cultural e social daquele bairro.

Isso forma a gente. Forma pensamentos. Eu conseguir vazar desse contexto e acabei me formando em outros espaços na minha adolescência. Mas penso muito sobre quem ficou e quem vive e cresce lá hoje. Se esse corpo geográfico não fica marcado na subjetividade das pessoas.

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