Resenha: "Sutura" (2024)
Na periferia a gente tem uma gíria que é "surra de gato morto" que seria apanhar até fazer o cadáver do pobre felino miar. Essa nova série do Amazon Prime, empresa que, lembremos, pertence ao vilão de filme de 007 Jeff Bezos, dá uma surra de gato morto em qualquer série enlatada americana e, acreditem, o gato mia.
Desde que voltamos a ter governos que incentivam a cultura, tenho visto que, cada vez mais, séries brasileiras têm se apresentado nos streamings. No entanto eu gosto de dois tipos de conteúdo no que tange a séries e filmes: 1. coisas que são extremamente profundas e reflexivas, e, 2. coisas que são "enlatadas", ou seja pecam na profundidade, mas que servem um entretenimento de qualidade.
Em geral, séries médicas são enlatados. A minha favorita, House, parecia mais a ficção científica (ou talvez ficção psiquiátrica) do que uma série que se prestasse a falar de uma rotina de um profissional de saúde. Aliás, House também seja uma ficção jurídica, já que seria impossível um cara daqueles não ter perdido sua licença depois de tanta loucura. Grey's Anatomy rima, por ironia, com Cinquenta Tons de Cinza beirando mais a um romance erótico médico do que com uma série desse estilo de verdade. E Sutura acaba misturando, de uma forma extremamente positiva, as duas coisas.
Sutura, uma produção Brasileira, conta a história de Ícaro Dias, um jovem médico que acaba de passar em primeiro lugar na residência em cirurgia de um dos hospiais mais "ricos" do Brasil, o fictício São Dimas. Negro e periférico, ele opta por essa residência porque ele quer aprender com a melhor cirurgiã do Brasil, a canhota (e isso parece ser algo relevante no campo da cirurgia), Adriana Mancini, uma das maiores do Brasil que teria chegado até mesmo a inventar técnicas.
Até aí tudo bem, mais uma série de médicos. OK. Mas não, logo descobrimos que Ícaro ainda não pegou seu CRM pois ele não terminou de pagar a faculdade, que segurou seu diploma. Depois disso eles acabam se envolvendo numa trama que é composta por facções criminosas, corrupção do alto escalão do hospial, cirurgias clandestinas, crítica social além de dilemas éticos.
A série consegue manter muito bem o rítmo dos enlatados americanos que precisam de cenas curtas e diálogos extremamente assertivos para preder a atenção de um público acostumado com o TikTok, ou seja, cuja atenção não dura mais que 30s. Como bom enlatado, tudo que acontece é extremamente absurdo. Temos cenas como médicos operando parentes em porões, perseguições de carro, sacadas de inteligência médica ao nível de House e cenas de sexo picantes com direito nús frontais generosos. Tudo que uma boa leitora de fanfic de Wattpad (ou de Kindle) preza.
Mas do jeito que eu estou falando, isso parece ruim, não? Aí é que está o pulo do gato (morto no nosso caso). Sutura consegue ter um rítmo tão frenético, mas cirurgicamente acertado que, somada as atuações tão intensas como a de Claudia Abreu (Mancine) e Humberto Morais (Ícaro), tornam o conjunto da obra um clássico instantâneo do gênero e te convencem dos absurdos que a trama narra te fazendo querer saber o que vai acontecer a seguir.
Também precisamos destacar os efeitos especiais da série que deixam no chinelo muitas séries médicas. E melhor, eles são efeitos práticos! Aqui você não vai ver aquela cena em 3D da corrente sanguínea do paciente, ou um coração palpitante flutando num éter rosa como era o caso de House. São efeitos práticos que são, salvo excessões mais pro fim da temporada como um coração muito bizarro que aparece, mas que são em geral muito boas!
Não sei se a série já foi renovada para uma segunda temporada, mas já estou na espera!
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